Impostos excessivos sobre jogos de aposta: Por que é uma coisa ruim

, Staffan Bergh

Atualizado11/10/2023

Categorias: Opinião

prática das apostas esportivas online foi legalizada no Brasil em dezembro de 2018 com a Lei 13.756. Os brasileiros passaram a poder realizar suas apostas em plataformas online hospedadas no exterior. O setor cresceu massivamente ano após ano e o país agora é visto com potencial para se tornar um dos maiores mercados de apostas do planeta.

regulamentação das apostas esportivas e jogos online tende a ser um marco histórico, tirando a indústria de uma ‘zona cinzenta’ e impondo tributação e regras específicas para a atividade. Entretanto, a proposta enfrentou diversos entraves, modificações e resistência de parte dos parlamentares brasileiros no Congresso Nacional.

No dia 13 de setembro, a Câmara dos Deputados deu um passo importante ao aprovar o projeto de lei que prevê a regulamentação da atividade. O texto agora está tramitando no Senado, que tem prazo até o final de outubro para votá-lo. O projeto incorpora o texto da Medida Provisória 1182/23, editada pelo governo federal para regular o setor.

Inicialmente, Apenas para Apostas de Quota Fixas

As normas inicialmente valiam somente para as apostas de quota fixa, as famosas ‘bets’. Lembrando que a proposta foi apresentada no mês de julho, junto com a MP 1.182/2023. O conteúdo da MP foi incorporado ao texto aprovado pela Câmara. O relator, deputado Adolfo Viana (PSDB-BA), surpreendeu ao incluir também a modalidade de jogos online, como cassinos online, no seu texto.

A proposta de regulamentar as apostas esportivas e jogos de cassinos online é interessante, uma vez que a maioria dos operadores oferecem os dois tipos de entretenimento em seus respectivos sites.

Inclusão Inesperada de Jogos de Cassino

Mas, a inserção dos jogos de cassino – que tem movimentado até mais dinheiro que as apostas esportivas atualmente no país – foi inesperada e impossibilitou debates mais aprofundados junto ao mercado, operadores, parlamentares e sociedade.

Além disso, o Governo Federal sempre deixou claro que a sua proposta se limitaria a definir normas claras para o setor de apostas esportivas, acabando com uma lacuna de regulamentação observada desde a sua legalização. A questão das demais modalidades de jogos online, portanto, deveria ser apreciada no Congresso.

Contudo, o foco das audiências públicas e debates foi praticamente todo voltado às apostas esportivas, impedindo que questões específicas da operação de cassino online fossem desmistificadas. Ainda que o prazo destinado ao tema também seja breve, a expectativa é que esses pontos sejam devidamente tratados em comissões e no Plenário do Senado.

Taxação do Setor de Apostas Esportivas

Sem dúvida, a tributação vem preocupando o mercado brasileiro e players que cogitam entrar no país. Esse ponto também sofreu alterações consideráveis na Câmara dos Deputados, inclusive havia a expectativa de redução dos impostos após um aceno do próprio governo brasileiro.

No dia 12 de setembro, véspera da aprovação do projeto de lei na Câmara dos Deputados, o governo federal sinalizou que estaria aberto a rever o percentual de taxação das empresas que operam apostas esportivas (bets) no Brasil. A informação foi dada pelo assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, José Francisco Mansurdurante participação em audiência da Comissão do Esporte da Câmara dos Deputados.

Na ocasião, Mansur sugeriu que o número poderia ficar abaixo dos 18%, mas a questão foi mantida, o que pode ser modificado no Senado. “Chegamos a uma flexibilização importante do imposto, algo que vai tornar o mercado muito acessível”, disse Mansur na ocasião.

Pelo projeto de lei, as empresas do setor ficarão com 82% do faturamento bruto (descontado pagamento de prêmios e imposto de renda), e não mais com 95%, como prevê a Lei 13.756/18, que criou esse mercado.

Custo Proposto para o Licenciamento

A outorga para o setor será bastante impactante, com o pagamento máximo de 30 milhões de reais pela autorização para operar no Brasil, a ser repassada para as empresas que preencherem todos os requisitos. De acordo com notícia da Agência Brasil, essa licença proporciona a utilização de um meio eletrônico (um aplicativo de apostas, por exemplo), por ato de autorização e necessitará ser quitado no prazo de 30 dias a partir do ato autorizado.

Essa autorização poderá, a critério do Ministério da Fazenda, ser por até três anos e terá caráter personalíssimo, inegociável e intransferível. Esse foi um dos pontos alterados e que pode impossibilitar a consolidação de um mercado seguro, profissional e responsável no país. Afinal, a medida provisória previa um período de licença válido por cinco anos pelo mesmo valor de R$ 30 milhões.

Cabe importante destacar que essa diminuição do prazo de licença foi incluída de forma inesperada, pegando a todos de surpresa e colocando em xeque a capacidade e o interesse de players em adquirir as autorizações para operar no país. Isso porque tanto valores quanto a duração da outorga desagradaram aos representantes do setor.

Novamente contrariando o que propunha o governo na MP 1182/23, somente poderão pedir autorização às empresas constituídas segundo a legislação brasileira, com sede e administração no território nacional, ficando de fora as estrangeiras.

Imposto para os apostadores

Outro ponto de atenção para o futuro do mercado brasileiro é o imposto em cima dos ganhos do apostador, que deverá pagar 30% de Imposto de Renda (IR) sob parcelas dos prêmios vencidos que exceder a faixa de isenção de R$ 2.112.

Aqui, vale esclarecer que os apostadores no Brasil não serão taxados em caso de derrotas ou se tiverem lucros abaixo da margem de isenção do IR. Ou seja, o brasileiro não será taxado somente por fazer uma aposta em uma plataforma licenciada no seu país.

Entretanto, essa foi outra questão que afligiu os representantes de empresas e associações ligadas à indústria de apostas online devido ao risco de levar jogadores para o setor ilegal a fim de fugir das pesadas taxas.

Por isso, a grande expectativa é que o nível de taxação tanto em cima do apostador quanto para as casas de apostas seja revisto durante a tramitação do projeto de lei no Senado.

Potencial do mercado brasileiro tende a ser ameaçada por alta tributação

O Brasil parece ser o centro das atenções da indústria mundial de apostas atualmente, uma vez que players internacionais buscam analisar e projetar o que esperar do país a partir da aprovação de uma regulamentação para apostas online.

De acordo com informações da Comscore, empresa de análise de dados e métricas de mídia digital, o Brasil já está em terceiro lugar no planeta em consumo de casas de apostas, superado somente por Estados Unidos e Inglaterra.

O segmento de apostas online é um dos que mais avançam, mobilizando cerca de 120 bilhões de reais por ano. Desde 2018, esse mercado se transformou em algo gigantesco e poderoso no Brasil. Um estudo recente, da Datahub, plataforma que atua com big data e analytics, aponta que esse setor online aumentou 360% entre 2020 e 2022.

O Brasil também se destaca no ranking de nações que mais entram em plataformas de apostas no planeta. Um relatório do Cupom Válido e do Similar Web indicou que foram mais de 14 bilhões de acessos em 2022. Ou seja, essa busca por plataformas de apostas online comprova que a prática caiu nas graças da população que adere a apostas em esportes e em jogos de cassino a cada dia.

Limitação do Crescimento com Impostos Altos

Entretanto, uma tributação excessiva pode limitar o crescimento desse setor de jogos online, impactando negativamente no desenvolvimento das empresas, geração de empregos diretos e indiretos e até na arrecadação do Governo Federal.

Somente 15% das empresas de apostas teriam estrutura e recursos para continuar com suas operações a partir da aprovação da regulamentação nos termos atuais. A projeção faz parte de um levantamento realizado pela Hand – uma assessoria independente e especializada na venda, compra e gestão de empresas – e publicado no site MoneyTimes.

Conforme esse estudo, o mercado de apostas nacional está apresentando índices de crescimento acima de 90% por ano, enquanto o mercado mundial não passa de 10% no mesmo período. Conforme a reportagem do MoneyTimes, o setor brasileiro tem condição de corresponder até um quinto do faturamento global – dependendo das normas específicas a serem aprovadas.

Preocupações do IBJR

O Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR), que nasceu da união de vários players já operando em território nacional, se manifestou contrário a diversos pontos do projeto de lei. O posicionamento demonstra preocupação também em relação aos riscos que uma tributação excessiva pode acarretar à indústria brasileira – ainda em desenvolvimento.

Em carta aberta publicada no Linkedin, o IBJR ressaltou que:

O texto, se aprovado na forma atual pelo Senado, tornará inviável às empresas e criação de produtos competitivos e atraentes aos consumidores, com prêmios incapazes de competir com os ofertados no mercado ilegal. Estes são os casos emblemáticos de países como Portugal e França, onde quase metade das apostas são feitas em sites não regulamentados.

Para se equiparar a mercados bem sucedidos, maximizando as receitas do governo e a proteção da integridade esportiva, das próprias apostas e combatendo a lavagem de dinheiro, o Brasil deve mudar de rota e tomar as seguintes medidas: estender a duração da licença de operação, readequar as alíquotas de tributação, adequar o licenciamento, além de revisar o cálculo para Imposto de Renda Retido na Fonte.

O projeto de lei aprovado pela Câmara representa um incentivo às operadoras que não estão interessadas em obter licença e pagar impostos no Brasil. Estas sabem que, se o texto não for alterado, estará garantido um mercado irregular próspero, onde os operadores legalizados não conseguirão competir”.

A versão completa pode ser acessada aqui.

A percepção do IBJR está bastante alinhada com os riscos da alta tributação mostrados pelo Estudo da Copenhagen Economics. Isso quer dizer que quanto mais elevado forem os impostos para empresas e apostadores, mais players e pessoas podem optar por sites irregulares ou fora do país.

O Futuro das Apostas Online no Brasil

Brasil, portanto, corre o risco de abrir mão de uma chance única de construir um setor de apostas online confiável, devidamente estruturado, transparente e posicionado entre os maiores do planeta. Ainda há tempo para que as mudanças sejam promovidas e uma regulamentação saudável para todos os interessados – governo, operadores e apostadores – seja aprovada, enfim.

Afinal, o diálogo sobre essa temática evoluiu e amadureceu consideravelmente nos últimos anos, fazendo com que tabus fossem superados pela sociedade civil e operadores comprometidos com as melhores práticas internacionais pudessem entrar – ou demonstrar interesse em contribuir com o ecossistema nacional.

O Brasil tem todas as ferramentas ao seu alcance para lançar regras condizentes com os desafios atuais em um cenário globalizado e conectado, permitindo que o seu mercado já nasça devidamente íntegro e pronto para desempenhar imediatamente um papel de protagonista no cenário mundial.